Suprema Corte dos EUA Anula Proibição de "Bump Stocks": Uma Análise Detalhada da Decisão e Suas Implicações

Por Mizael Xavier
Suprema Corte dos EUA Anula Proibição de "Bump Stocks": Uma Análise Detalhada da Decisão e Suas Implicações

Suprema Corte dos EUA e a Reversão da Proibição dos "Bump Stocks"

A Suprema Corte dos Estados Unidos reverteu, em uma decisão de 6 votos a 3, a proibição federal dos "bump stocks", acessórios que permitem que rifles semiautomáticos disparem em uma cadência semelhante à de metralhadoras. A medida havia sido implementada durante o governo de Donald Trump em resposta ao massacre de Las Vegas em 2017, onde o atirador utilizou esses dispositivos para matar 58 pessoas e ferir centenas. A decisão do mais alto tribunal do país reacendeu o debate sobre o controle de armas e a autoridade das agências regulatórias.

O Entendimento da Maioria sobre os "Bump Stocks"

A maioria conservadora da Corte, em voto relatado pelo juiz Clarence Thomas, argumentou que a Agência de Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos (ATF) excedeu sua autoridade ao reclassificar os "bump stocks" como metralhadoras sob a lei federal existente. Segundo Thomas, um rifle semiautomático equipado com um "bump stock" não se enquadra na definição legal de metralhadora, pois ainda dispara apenas um tiro a cada acionamento do gatilho. Ele explicou que o acessório apenas reduz o tempo entre os disparos, mas não altera o ciclo fundamental de funcionamento da arma, que requer uma ação separada do gatilho para cada projétil. O juiz chegou a incluir diagramas no texto da decisão para ilustrar o funcionamento dos mecanismos de disparo.

O argumento central é que a lei define "metralhadora" como uma arma que dispara múltiplos tiros "por uma única função do gatilho". Para a maioria, mesmo com o "bump stock", o rifle semiautomático continua exigindo que o gatilho seja rearmado e acionado para cada disparo, ainda que de forma muito rápida devido ao mecanismo do acessório. O juiz Samuel Alito, em uma concordância separada, sugeriu que, embora o massacre de Las Vegas tenha destacado a necessidade de uma possível alteração na lei, esse evento por si só não muda o significado da legislação vigente, cabendo ao Congresso legislar sobre o assunto.

A Dissidência e as Preocupações com a Segurança Pública

A juíza Sonia Sotomayor, acompanhada pelos outros dois juízes liberais, apresentou uma contundente dissidência, lendo-a inclusive do tribunal, um ato raro que sublinha a discordância. Sotomayor argumentou que a maioria adotou uma definição excessivamente técnica e restrita de "metralhadora", ignorando o propósito da lei e as consequências mortais da decisão. Para os dissidentes, um rifle equipado com "bump stock" funciona, na prática, como uma metralhadora, permitindo centenas de disparos por minuto. Sotomayor utilizou a analogia: "Quando vejo um pássaro que anda como um pato, nada como um pato e grasna como um pato, chamo esse pássaro de pato". Ela alertou que a decisão dificultará os esforços do governo para manter armas perigosas longe de indivíduos como o atirador de Las Vegas.

Contexto Histórico e Reações à Decisão sobre os "Bump Stocks"

A proibição dos "bump stocks" pela ATF ocorreu em 2018, após o massacre em Las Vegas, onde o atirador utilizou esses dispositivos para aumentar drasticamente a letalidade de seus ataques. A ATF, sob a administração Trump, reverteu sua posição anterior de que os "bump stocks" não eram metralhadoras e determinou que fossem destruídos ou entregues às autoridades. Estima-se que cerca de 520.000 "bump stocks" foram vendidos entre 2010 e 2018.

A decisão da Suprema Corte foi criticada por defensores do controle de armas e pela administração do presidente Joe Biden, que defendeu a manutenção da proibição. Biden instou o Congresso a aprovar uma lei proibindo os "bump stocks" e outras medidas para aumentar a segurança das armas. Por outro lado, grupos defensores dos direitos às armas e o autor da ação, Michael Cargill, proprietário de uma loja de armas no Texas, celebraram a decisão como uma vitória contra o que consideram um excesso regulatório. A campanha de Donald Trump afirmou que a decisão da Corte deve ser respeitada, reiterando seu apoio à Segunda Emenda da Constituição americana, que garante o direito de portar armas.

O Funcionamento dos "Bump Stocks"

Os "bump stocks" são acessórios que substituem a coronha padrão de um rifle semiautomático. Eles utilizam a energia do recuo da arma para fazer com que o rifle deslize para frente e para trás, permitindo que o dedo do atirador pressione o gatilho repetidamente em rápida sucessão, sem que o atirador precise mover ativamente o dedo para cada disparo. Isso simula o disparo automático, aumentando significativamente a cadência de tiros. Embora possam aumentar a velocidade de disparo, alguns especialistas apontam que os "bump stocks" podem reduzir a precisão da arma.

Implicações Legais e o Futuro da Regulamentação de Armas

A decisão da Suprema Corte não se baseou na Segunda Emenda, mas sim na interpretação da lei federal existente sobre metralhadoras, especificamente o National Firearms Act de 1934 e suas emendas posteriores, como a Lei de Controle de Armas de 1968 (Gun Control Act of 1968). A questão central era se a ATF tinha autoridade para reinterpretar a definição de "metralhadora" para incluir os "bump stocks". A Corte entendeu que a agência excedeu essa autoridade, cabendo ao Congresso, e não a uma agência federal, a decisão de proibir tais dispositivos através de legislação específica. Esta decisão levanta questões sobre a autonomia das agências federais na interpretação e aplicação de leis. O debate sobre o controle de armas nos Estados Unidos permanece intenso e polarizado, e esta decisão certamente adiciona um novo capítulo a essa discussão complexa.

Mizael Xavier

Mizael Xavier

Desenvolvedor e escritor técnico

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